sexta-feira, 6 de março de 2009

Excertos de uma Carta Eliminada

Escrevinhava enquanto pensava no que escrever, como se houvesse escrever e escrever, e desenhava um poema, distraído, construído nos becos e arrancado dos becos que ecoavam o pensamento do seu silêncio.

Era de noite na cidade

Os ébrios arrastavam-se, perdidos,

As prostitutas volviam-se, nos seus abrigos,

Os gatos assombravam presságios de amor,

A lua contava uma estoria de dor.

Os lampiões das ruas desertas

Soltavam baças sombras,

E no prédio velho aquela ultima luz,

Na última janela, tremeluzia apagada.


Foi ai que tomei a estrada,

Perguntava-me o que foi de nós e tu dizias:

Nada.

Foi então que dei por ti atropelada

Sirenes de cigarras assombiavam, e tu eras

Nada.

Os gatos perdiam-se no teu cadáver,

E tu eras

Tudo.

7 comentários:

  1. "Escrevinhava enquanto pensava no que escrever, como se houvesse escrever e escrever, e desenhava um poema(...)"

    sei do que falas, e identifico-me. geralmente, sempre que tento escrever algo, é isso que sinto: escrever e escrever. ajusto aqui, ajusto ali. apago uma coisa, meto outra, como um desenho :)
    O poema está muito bonito, muito visual. Sinto.

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  2. :) grato, punch.

    "O poema está muito bonito, muito visual. Sinto."

    A tua forma de falar faz-me sempre sorrir.

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  3. um dia escrevi algo que o teu poema me fez relembrar... não gostei do meu, tanto que já não sei do que escrevi, mas gosto do teu, gosto do que escreves, da tua escrita versátil, ainda assim, dinâmica, estruturada e racional (no sentido de entendida e sentida, o que faz entender e sentir)
    volto a repetir, gosto do que escreves e não faz para mim qualquer sentido tentar por algo que tenha gostado à frente deste poema que também gosto, mas não tanto como outros que já li (refiro-me aos teus poemas, não a outros), não faz sentido tentar dar-te a saber do estilo literário que mais me agrada em ti, ou a mistura de quais, quando talvez nem o saiba explicar convenientemente; o importante é aquilo que sentimos, aquilo que sentes, aquilo que exprimes e fazes sentir.
    logo, direi apenas que continuo aqui para ler e comentar, quando estiver e puder, para me assegurar que não deixarás de escrever e de sentir como eu, como nós, os três :)

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  4. "E tu eras
    ...
    *engole em seco*
    ...
    Tudo"
    *um murmúrio só*



    Isto é lindo.
    (Isto e tudo o que o precede)

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  5. Este comentário foi removido pelo autor.

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  6. Lobo Afonso (este nome é excelente), continua. Eu fiquei muito contente quando me certifiquei que também aqui estavas. Obrigado pelas palavras e por partilhares comigo este espaço.


    Alexiel, essa beleza é tua, que sobre ela murmuras. Acho-te grande.

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  7. Normalmente, meu caro, a uma tirada dessas responderia com um irónico e cantante "sou grande mas não sou grande coisa!"

    Mas não a ti.
    A ti ouço-te apenas e sorrio :)*

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